sexta-feira, 9 de outubro de 2015

O 21


 No final do século XIX, a Gleba Anita Garibaldi, mais conhecida como KM 21, estrada Castanhal-Terra-Alta, município de Castanhal, no Pará, foi designada para receber colonos italianos, num acordo político entre Brasil e Itália. As famílias italianas chegaram a ser conduzidas para a área, mas não permaneceram lá devido às difíceis condições de vida na época (sem recursos, conduções ou estradas). Posteriormente, já no início do século XX, por ocasião da Grande Seca de Quinze ocorrida no Ceará, diversos colonos cearenses iniciaram um processo de colonização do lugar, incentivados pelo governo do ceará e do Pará. Muitas famílias que até hoje vivem no 21 são descendentes destas primeiras levas de nordestinos que colonizaram a região. Até hoje, a memória das viagens, as comidas, a forma de falar, e outros hábitos, permanecem na cultura local, juntamente com saberes que estes nordestinos adquiriram com os moradores das áreas próximas, na região do Salgado. O romance "O Quinze", de Rachel de Queiroz, descreve aspectos do flagelo da seca no Ceará. No Pará, o poeta e escritor Bruno de Menezes publicou o romance "Candonga" sobre a ocupação nordestina na região da estrada de ferro Belém-Bragança.

Até meados da década de 1980 diversas manifestações musicais ocorriam entre o KM 21 e o KM 23 da Estrada Castanhal - Terra-Alta. Possivelmente, nos demais KM também ocorriam, mas os relatos recolhidos em pesquisas abordam apenas este perímetro. Tais manifestações eram, principalmente, Cordões de Bichos (do cachorro, do Azulão, da Cutia) e Boi-Bumbá, que aglutinam música, dança, teatro, poesia, crítica social, arte visual e muitas outras habilidades performáticas. Estes grupos eram chamados durante os festejos juninos e realizavam suas apresentações nos terreiros ou nas salas das casas, sempre a convite dos donos das residências. Diversas transformações ocorrem na localidade, incluindo a chegada da energia elétrica nos ramais adentro e a facilidade de transporte às cidades de Castanhal e Belém. Assim, outros gêneros musicais passaram a fazer parte do cotidiano das pessoas, como os bregas e os tecnomelody, com as festas de aparelhagens.

Para saber mais:
 COHEN, Marcos; MARIANO, Benedito. Cordão de Azulão. PPGARTES, 2010.
LACERDA, Franciane Gama. Migrantes Cearenses no Pará. Faces da Sobrevivência (1889/1916). Belém/Pará: Açaí, 2010.
LUZ, Jefferson. “Cadê o Azulão? Transformações culturais e o desaparecimento de um cordão de pássaro”. Dissertação de mestrado. PPGARTES/UFPA, 2011.
MENEZES, Bruno de. “Batuque” In Obras Completas. Volume I. Obra Poética. Coleção Lendo o Pará. Nº 14. Belém, Pará: SECULT, 1993.
___________________. “Candonga” In Obras Completas. Volume II. Obra Poética. Coleção Lendo o Pará. Nº 14. Belém, Pará: SECULT, 1993.
NEVES, Frederico de Castro. “Curral dos Bárbaros: os campos de concentração no Ceará”. In Revista Brasileira de História. São Paulo, V. 15, nº 29, pg. 93 – 122, 1995.
QUEIROZ, Rachel de. “O Quinze”. Rio de Janeiro: José Olympio, 2004..

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